segunda-feira, 16 de março de 2009

EXCOMUNHÃO


ENTRE A MORAL E A MISERICÓRDIA

A excomunhão é instrumento de conscientização da Igreja, mas ainda causa polêmica.

Curitiba - A excomunhão dos médicos que induziram o aborto de gêmeos em uma menina de 9 anos, vítima de estupro, causou polêmica em todo o País. Os profissionais, que foram declarados excomungados pelo arcebispo de Olinda e Recife, dom José Cardoso Sobrinho, teriam realizado o procedimento para proteger a vida da criança, vítima de abuso sexual pelo padastro desde os seis anos de idade. Ao choque com os detalhes sórdidos da violência sofrida pela menina (e pela irmã de 14 anos, deficiente mental e também abusada sexualmente pelo padrasto), se somou a estranheza com o reação extrema do bispo. ''Pesa contra o termo excomunhão toda a carga medieval, quando ela tinha uma função política'', explica o doutor em teologia e coordenador do Mestrado em Teologia da Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUC-PR), Mário Sanches. ''Mas as finalidades da excomunhão não é excluir e, sim, indicar ao fiel a gravidade dos delitos que ele tenha perpetuado'', avalia. Segundo Sanches, ao excomungar um fiel, a Igreja está chamando a atenção para o pecado cometido. ''É um alerta'', diz. ''Estar excomungado é estar fora da comunhão. Mas não significa que as portas da Igreja estarão fechadas. Pelo contrário, a expectativa é que a pessoa reflita, se arrependa, confesse e volte para a religião'', explica. Para dom Ladislau Biernaski, bispo auxiliar de Curitiba, ''a Igreja tem considerado a excomunhão como uma medida medicinal'', revela. ''É para a pessoa cair em si, se arrepender e voltar''. Segundo o bispo, a excomunhão pode ser determinada pela Igreja quando alguém comete um delito grave ou quando o fiel recaí no mesmo pecado mais de uma vez. ''Mas a Igreja sempre alerta, educa esse fiel para que ele se conscientize do erro'', diz. Na semana passada, a Confederação Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) divulgou um texto esclarecendo o significado da excomunhão. ''É lamentável o acontecido'', declarou o secretário-geral da instituição, dom Dimas Lara. ''A excomunhão nada mais é do que dizer a uma pessoa: o seu pecado é tão grave que você está fora da comunhão da comunidade'', diz o texto divulgado por padre Enrique Pérez Pujol, assessor canônino da CNBB. Para a CNBB, apesar de aparentemente dura, a excomunhão persegue um objetivo bom: o de que esse tipo de coisa não se justifique (por parte da comunidade) e não se pratiquem (por parte dos indivíduos). ''A excomunhão não é uma medida vingativa. Certamente há casos em que a Igreja se enganou, mas os propósitos por trás dela são os de fé e misericórdia'', completa. Apesar dessas considerações, o coordenador do Núcleo Paranaense de Estudos em Religião, Sylvio Fausto Gil, da Universidade Federal do Paraná (UFPR), reconhece que o peso da excomunhão na sociedade brasileira continua grande. ''O peso simbólico é significativo. É uma condenação moral'', analisa. Gil avalia que, mesmo num país com diversidade religiosa como o Brasil, a moralidade religiosa ainda desempenha um papel cultural significativo. ''É um país predominantemente cristão, e a base moral é comum às igrejas cristãs'', aponta. O professor explica que as pessoas costumam construir sua identidade pela cultura religiosa hegemônica. ''Nós temos a impressão de que o brasileiro transita por mais de uma religião, mas o que se notou é que ele se vê como adepto de uma única denominação. O fiel do Brasil não relativiza a moral. Mas vejo que o peso da excomunhão é maior para pessoas ligadas à Igreja, como os padres'', analisa.


Outras religiões também expulsam fiéis


Curitiba - A Igreja Católica não é a única religião organizada que possui instrumentos para expulsar fiéis. ''O mecanismo da excomunhão existe nas mais diferentes denominações, mas com outras nomenclaturas'', esclarece o doutor em Teologia, Mário Sanches. ''Conheço igrejas que expulsam o fiel que se casa com alguém que não é devoto daquela congregação ou até mesmo quem não pagou o dízimo'', conta. ''A comunidade religiosa tem um conjunto de regras cuja adoção é parte do processo de adesão do fiel. Se ele rompe com esses preceitos, se afasta do grupo'', complementa o coordenador do Núcleo Paranaense de Estudos em Religião, Sylvio Fausto Gil, da Universidade Federal do Paraná (UFPR). Segundo Gil, o processo de expulsão de um fiel é mais grave em sociedades nas quais a religião tem papel mais significativo. ''Nos Estados Unidos, por exemplo, há muita diversidade de igrejas, o que faz com que o efeito de uma condenação pública seja diluído'', relata. A situação, no entanto, é mais complexa nos estados islâmicos nos quais a religião e o governo se confundem. ''Ser expulso da religião num país como esse significa deixar de ser cidadão em muitos casos'', aponta Gil. Geralmente, a exclusão de um fiel é motivada pela heresia, ou seja, o desafio a preceitos e dogmas da denominação.


SAIBA MAIS
Quem já foi excomungado:

MARTINHO LUTERO
Questionou a venda de cartas de indulgência. Quando foi punido por Roma queimou documentos católicos em protesto e acabou excomungado pelo Papa Leão X. O episodio marca uma das mais importantes cisões do Cristianismo.

FRANCO BARBERO
Padre italiano que foi excomungado pelo bispo de Piemonte (Itália) por ter abençoado o casamento entre homossexuais.

EMMANUEL MILINGO
Arcebispo africano que foi excomungado depois de realizar cerimônia de ordenação de padres casados. Criou a organização “Married Priest Now!” (Padres Casados Já!)

SINÉAD O´CONNOR
Cantora irlandesa excomungada por ter se ordenado sacerdotisa de uma seita católica.

FIDEL CASTRO
Ditador cubano expulso da igreja por proibir a religião católica em Cuba.

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